Uma antiga fábrica de cerâmicas que passou 26 anos em ruínas em Recife revela a densa e inquietante coleção de esculturas, pinturas e cerâmicas do renomado artista Francisco Brennand.
O conjunto de edifícios, inserido em uma floresta tropical nos arredores da capital pernambucana era propriedade de seu pai e foi uma fábrica de telha e tijolos. Abandonada em 1945 e restaurada pelo próprio Brennand em 1971, o local se transformou em seu museu particular e também em uma oficina onde, aos 84 anos, ele trabalha diariamente.
Brennand explicou à agência Efe que a oficina não está concluída e ainda falta muito trabalho no local, onde pretende “glorificar” a memória de seu pai e a história da região, onde, segundo ele, foi forjada a consciência brasileira durante a guerra contra os holandeses, no século 17.
“A oficina era o lugar dos meus jogos de infância, um lugar propício ao mistério. Era isolado, escuro”, lembrou o artista, que com a reforma quis conservar “o fetiche, a magia e a memória” do recinto.
“A floresta cresceu em torno de mim durante 40 anos e a oficina ficou como um ninho. O conjunto passou a ter para mim um valor místico, como se fosse um santuário. Estas peças que vão enchendo o local contam com uma espécie de mitologia pessoal, onde abordo à minha maneira mitos que me interessam, figuras históricas”, relatou.
Brennand começou sua carreira artística na década de 40, período no qual viajou à França, estudou e se inspirou em obras de Pablo Picasso e Joan Miró, antes de se encantar pela cerâmica como seu principal meio de expressão.
Centenas de esculturas, com formas abstratas, retorcidas, remetem ao sexo, ao nascimento e à morte, e povoam as salas da velha fábrica, além das fontes e jardins, um deles desenhado pelo célebre paisagista Burle Marx.
Um dos edifícios está dedicado às suas pinturas e tem as mulheres como tema principal, com técnicas variadas que passam da cera ao carvão. Os edifícios são inteiramente decorados com cerâmicas brilhantes saídas dos fornos da antiga olaria.
Com sua barba branca e apoiado em uma bengala, Brennand gosta de receber os visitantes do museu pessoalmente, embora reconheça que a maioria das pessoas “deteste” sua arte e só consiga apreciar a beleza da oficina e da paisagem da exuberante floresta.
Suas obras foram expostas em várias cidades brasileiras e em países como Estados Unidos, Alemanha, França, Espanha, Bélgica e Itália. Brennand comentou que sua arte responde a seus problemas e dúvidas pessoais de ordem existencial. Através das suas obras, o artista falou que busca “uma linguagem mais próxima ao eixo do mundo”, que faça um retrato profundo do homem.
Brennand comentou que o motivo de suas esculturas serem dotadas de “uma carga sexual” é porque o ser humano não consegue encontrar sentido para o sexo. “Mais do que a morte, ele deixa o homem diante de uma perplexidade insondável”, disse Brennand.
O artista também questiona as pessoas que o julgam pelo suposto erotismo de suas figuras. “Minhas esculturas não são eróticas, podem até chamá-las de espantosas, terríveis, o horror da existência. As mulheres querem ser retratadas pela “Playboy”, não da forma como eu as vejo. Mas minhas deformações não são a busca do feio, e sim do belo. A deformação é a homenagem à forma”, especificou.
Fonte: Folha Turismo