Após se demitirem de banco, eles dão volta ao mundo em uma Land Rover.
Plano é percorrer 192 mil km por 70 países de 5 continentes.
Eles estão viajando há três meses e meio, rodaram mais de 22 mil quilômetros e conheceram cinco países. Parece muito, mas Leonardo Spencer, de 29 anos, e Rachel Paganotto, de 27, ainda têm um longo caminho pela frente.
O casal partiu no dia 4 de maio para uma viagem pelo mundo que está prevista para durar 42 meses. Nesses três anos e meio, eles pretendem dirigir por cerca de 190 mil quilômetros e conhecer 70 países.
Para fazer essa aventura, Leonardo e Rachel largaram um emprego de oito anos no mercado financeiro, salários altos e a vida confortável que levavam em São Paulo.
Se antes eles moravam em um apartamento de três quartos no bairro da Vila Madalena, hoje dividem um espaço de 5 m²: a Land Rover onde viajam e dormem, que tem uma barraca acoplada.
Os dois, que até pouco tempo atrás não faziam percursos de carro mais longos do que de São Paulo até o litoral paulista, contam que sempre gostaram de viajar, mas nunca tiveram o perfil de mochileiros. Ela nunca havia acampado antes, e ele tinha vivido essa experiência poucas vezes.
A ideia da viagem surgiu há um ano, após visitarem a exposição de fotos de um amigo que havia dado a volta ao mundo de bicicleta. “Vimos que dava pra fazer aquilo de carro, e começamos a pensar o que queríamos da nossa vida. Estávamos acomodados e queríamos sentir mais frio na barriga. Tínhamos uma grana guardada e vimos que quanto mais tempo demorássemos, mais acomodados ficaríamos”, explica Rachel.
No início, a reação da família, dos colegas de trabalho e dos amigos foi de surpresa. “Todo mundo questionou muito. As pessoas falavam: ‘Vocês estão malucos? Como vão viver no carro? Vão jogar tudo para o alto?’ Foi todo um processo”, diz Leonardo.
Roteiro
A rota planejada começa pela América do Sul e sobe até os Estados Unidos, visitando os países da América Central. Em seguida, cruzam o oceano em direção à Europa, de lá vão para África, para a Ásia e para a Oceania.
A ideia é ficar ao menos uma semana em cada país, mesmo em países bem pequenos. “A gente poderia dar uma volta ao mundo em um ano dirigindo mil quilômetros por dia, mas queríamos aproveitar mais. Só na Austrália pretendemos ficar cinco meses”, diz Rachel.
O roteiro tem uma certa flexibilidade, mas o casal estabeleceu algumas metas: por exemplo, estar no verão na Europa e chegar à região do Serengeti, na África, na época da migração dos animais.
Eles rodam, em média, 250 km por dia. O carro foi batizado de Coyote, em uma menção ao personagem de desenho animado que perseguia o Papaléguas. “Ele vai devagar, mas nunca desiste”, brinca Leonardo.
Ele acrescenta que o veículo tem uma estrutura que permite “viver por dois ou três dias longe da civilização”, que inclui, além da barraca, armário, geladeira, fogão e tanque de água.
Quando não há camping onde eles podem parar, Rachel e Leonardo ficam em hotéis baratos – um deles era tão ruim que ela teve que dormir com várias calças e blusas, gorro, luva, meias térmicas e edredom, para aguentar o frio de – 5°C que o quarto não vedava.
Costumam cozinhar, mas fazem questão de ir a restaurantes de chefs conhecidos, já que gostam de gastronomia.
Os vídeos e as fotos da viagem são de autoria de Leonardo, que é fotógrafo amador. Eles postam algumas delas em seu site Viajo, Logo Existo, e na sua página no Facebook, que tem mais de 18 mil seguidores.
186 barras de cereal, 6 dias sem banho
Quando pediram demissão do banco, Rachel e Leonardo largaram as planilhas para trás, mas a mania de mexer com números não os abandonou. Ao longo da viagem, eles registram tudo: quilômetros rodados, diesel consumido, o clima em cada lugar, o número de fotos tiradas.
As estatísticas incluem até os dias sem tomar banho (seis, até agora), as refeições gratuitas (nove), as barras de cereal consumidas (186) e os desentendimentos entre os dois. Eles registraram cinco “desarranjos”, mas zero “briga séria”. Juntos há três anos e casados desde abril deste ano, os dois dizem que tentam evitar ao máximo os atritos despertados pela convivência tão frequente.
“Quando dirigimos o dia todo, sem comer direito, a chance de discutirmos à noite é grande. Mas tentamos levar tudo pelo bom humor. Sem uma pessoa em quem você confie, que te ajude, a viagem perde o brilho”, diz Leonardo.
O planejamento financeiro também é levado a sério. Já antes de sair do Brasil, eles haviam despendido R$ 164 mil com os preparativos, incluindo a compra do carro. Ao longo do percurso, todos os gastos são registrados, para evitar sair do previsto — que era de US$ 100 por dia, mas já foi reajustado para US$ 95, devido à alta do dólar.
A viagem já teve seus momentos difíceis. Em uma praia no Chile, eles foram vítimas de um golpe.
Ladrões furaram o pneu do carro e, enquanto eles se entretinham trocando-o, tiveram uma mochila roubada, contendo equipamentos fotográficos no valor de US$ 9 mil.
Como haviam feito seguro, recuperaram algumas coisas, mas tiveram um prejuízo de US$ 2 mil e passaram a tarde toda na delegacia de polícia.
Apesar de tudo, fica a sensação de que tomaram a decisão certa. “Aprendemos em três meses coisas que levaríamos anos para aprender. Exercitamos a paciência, a disciplina com os gastos, um olhar de respeito sobre a cultura de cada lugar. Isso não tem preço. Fora que, se expondo a tudo isso, ou a gente volta separado ou não separa mais”, brinca Rachel.
Se depender de Leonardo, a relação ainda vai durar muitos anos: “Vamos poder contar para os nossos netos que demos a volta ao mundo”, afirma.