Uma região próxima, barata e pouco desvendada – é assim que o paulista Leonardo Spencer, de 29 anos, e a gaúcha Rachel Paganotto, de 27, definem a América do Sul. Os dois brasileiros largaram bons empregos no mercado financeiro, em São Paulo, para viajar o mundo. No último fim de semana, o casal encerrou um roteiro por seis países sul-americanos, depois de cinco meses e meio de viagem e 30 mil quilômetros rodados de carro.
Agora, os dois seguem para o Panamá e, de lá, vão percorrer mais cinco países da América Central, até chegar ao México e aos EUA. Fazendo um balanço dos trajetos percorridos entre Argentina, Uruguai, Chile, Peru, Equador e Colômbia, a dupla dá dicas para os turistas mais aventureiros e também para quem gosta de conhecer o “lado B” de cada lugar.
De vulcões no Chile à alta (e barata) gastronomia peruana, passando pelas grandes semelhanças entre Brasil e Colômbia, Leonardo e Rachel fazem sugestões para mochileiros, amantes da natureza e para quem gosta de história. Segundo eles, tudo no Brasil é mais caro: aluguel de automóvel, combustível, hospedagem, comida. Por isso, vale tanto a pena visitar os vizinhos – ou melhor, los vecinos.
“Além disso, como viajante, a gente se expõe a coisas que não costuma fazer na terra natal”, destaca Leonardo.
El Calafate e Perito Moreno (Argentina)
A pequena cidade de El Calafate, no sul da Argentina, já perto da fronteira com o Chile, é a primeira dica do casal brasileiro, que foi ao local pela segunda vez – a primeira foi em 2011 – e desta vez ficou cinco dias, em maio.
“Se você vai para a Patagônia, a referência é El Calafate. É uma cidade com todos os serviços, onde há desde hostels baratos (de US$ 5) até hotéis cinco estrelas com tudo incluído”, ressalta Leonardo.
Rachel acrescenta que, ao contrário de Bariloche, esse é um lugar pequeno, que lembra Campos do Jordão (SP) e de onde é possível ir até o glaciar Perito Moreno, a 90 km da cidade. A estrada já é um atrativo à parte, com lagunas e montanhas ao fundo. Chegando ao glaciar, descrita pelos brasileiros como a “cereja do bolo” de El Calafate, há a opção de fazer trekking na geleira. Desta vez, os dois não se aventuraram porque o passeio estava fechado – muitas opções na região fecham principalmente entre junho e setembro, considerada baixa temporada.
“A gente foi no frio, mas no verão dá até para usar camiseta. Como já conhecíamos o lugar, ficamos mais tranquilos, caminhamos pela cidade, vimos uma lagoa com flamingos. No inverno, amanhece às 9h e escurece às 17h, então tem que aproveitar bem o tempo”, explica Leonardo. Já no verão, o dia é mais longo: vai das 7h às 22h, em média.
Além desses passeios, o casal recomenda visitar o museu de gelo Glaciarium, a 7km de El Calafate, que tem uma estrutura de alumínio moderna, custa menos de US$ 10 para entrar e conta a história do gelo no mundo. Outra dica é conhecer a cidade de El Chatén, a 3h de viagem. O local agrada aos mochileiros e a quem gosta de montanha, pois tem várias trilhas.
Colônia do Sacramento (Uruguai)
A viagem passou também pelo Uruguai, onde os brasileiros destacam a cidade de Colônia do Sacramento, 180 km a oeste da capital Montevidéu. Dá para chegar até lá de barco, saindo de Buenos Aires, num percurso de 2 horas. Muitas pessoas acabam passando o dia e voltando para o lado argentino.
“O local é Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Tem um bairro velho de colonização portuguesa e espanhola, tudo meio misturado. A cidade é um pouco parecida com Paraty (RJ), tem ruas de pedra, restaurantes pequenos, uma pracinha”, conta Leonardo.
Segundo ele e a mulher, Colônia também tem um farol de onde é possível ver toda a região. É um roteiro ideal para quem busca tranquilidade e um passeio mais bucólico e nostálgico.
“Fora do bairro velho, há vários restaurantes e serviços, campings e hotéis sofisticados”, diz Leonardo. Rachel completa: “Se você for a Buenos Aires e estiver com dias sobrando, vale a pena acordar, pegar uma lancha e conhecer um país diferente. O preço da travessia também é acessível”.
Quando os brasileiros estavam em El Calafate, na Argentina, acabaram cruzando a fronteira chilena, em direção a Torres del Paine, numa viagem de 6h para o sul. Lá, há um parque nacional considerado Reserva da Biosfera pela Unesco, onde existem tanto campings quanto hotéis de luxo que custam a partir de US$ 500 a diária.
“Há várias estradinhas, e cada curva tem um visual maravilhoso. O nome Torres del Paine faz referência a um conjunto de montanhas de granito avermelhadas”, revela Leonardo.
O segundo destino chileno recomendado por ele e a mulher é a cidade de Pucón, 780 km ao sul de Santiago. Essa é a porta de acesso para um vulcão inativo chamado Villarrica, que pode ser escalado dentro de um parque nacional. O casal optou por não se arriscar porque achou que o passeio poderia ser perigoso para quem não tem experiência.
“A cidade em si é pequena, charmosa, dá para fazer tudo a pé, pois o local gira em torno de dois ou três quarteirões. Há, ainda, opções de termas, piscinas, cachoeiras e mirantes. Também existe um lago gigante que parece praia, onde as pessoas ficam tomando sol e bebendo chimarrão. É um passeio bom para jovens e mochileiros”, diz Leonardo.
Cusco (Peru)
Ao contrário da maioria dos turistas, que dá dicas de Lima ou Machu Picchu, Leonardo e Rachel escolheram indicar Cusco. Considerada Patrimônio da Humanidade pela Unesco, a cidade dá acesso a Machu Picchu – 90% das pessoas que chegam ali estão de passagem para as ruínas incas.
“É um lugar lindo, relativamente grande, mas o centro histórico tem ruas pequenas, igrejas bonitas e bem conservadas”, afirma Leonardo.
Outra dica é visitar o museu do chocolate de Cusco, onde é possível ter aulas sobre como torrar o cacau e fazer barras, que podem ser comidas ali mesmo ou levadas para casa.
“Também dá para comprar um ticket na cidade que permite o acesso a todos os museus, durante três dias. É mais vantajoso”, diz Rachel.
Em Cusco, o casal também recomenda uma passada pelo Vale Sagrado, onde há ruínas incas, salinas com várias “piscinas” brancas, montanhas e um anfiteatro parecido com um “Coliseu dentro da terra” onde antigamente se faziam experimentos de agricultura.
“Machu Picchu é tão grandioso, que os outros lugares depois parecem pequenos. Mas vale desvendar mais Cusco”, diz Rachel. A alta temporada na região vai de junho a outubro, pois nos outros meses chove muito.
No Equador, por onde o casal passou em setembro, a dica é ir de carro da capital Quito até Cuenca, num percurso de cerca de 430 km rumo ao sul. Para fazer todo o trajeto, é necessário ter de cinco a sete dias disponíveis, segundo Leonardo.
O primeiro ponto de parada sugerido é Baños, um lugar que lembra Brotas (SP), com opções de ecoturismo. No local, ficam o vulcão mais ativo do mundo, o Tungurahua, e uma casa na árvore de onde é possível admirar as erupções – quando os brasileiros chegaram, porém, não conseguiram ver lava, mas aproveitaram o visual mesmo assim.
“De Baños, fomos até Riobamba, que fica a 80 km – o que leva até 2 horas e meia, por causa da condição das estradas. Lá, fica o vulcão inativo Chimborazo, numa região de vários vulcões. Dá para ir de carro a 4.800 metros e andar mais 200 metros até o topo do vulcão. Subimos bem devagar, com o pulmão já na boca. Mas o visual é lindo, o parque está bem conservado e há animais selvagens, como guanacos”, conta Leonardo.
Chegando a Cuenca, que também é considerada Patrimônio da Humanidade pela Unesco, há dezenas de igrejas enormes, muito comércio, bons restaurantes e música na praça principal para relaxar.
“Essa cidade charmosa é onde mais americanos aposentados moram fora dos EUA. O combustível lá custa ¼ do valor no Brasil. E é onde se fabricam os chapéus-panamá: há pessoas tecendo, lojas especializadas. A exportação é que é feita pelo canal, que acabou levando a fama”, diz Rachel.
Medellín (Colômbia)
O último roteiro recomendado pelos brasileiros na América do Sul é Medellín, na Colômbia, onde eles se hospedaram na casa de uma brasileira que conheceram pela internet – ao todo, o casal diz que já tem “uns 30 convites de hospedagem pelo mundo”. A cidade de 3 milhões de habitantes fica a 400 km de Bogotá, a quase 2 mil metros de altitude e atualmente está na época de chuva, que dura até fevereiro.
A Colômbia não estava no roteiro inicial dos dois, por uma “questão de segurança”, pois havia um receio de sequestros e de ações das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Eles, porém, encontraram vários turistas ao longo da viagem que disseram que o país estava seguro, que as pessoas eram amáveis e não havia problemas. Eles, então, seguiram para lá.
Segundo Leonardo e Rachel, Medellín se parece muito com São Paulo, com regiões desenvolvidas, bonitas, shoppings e carros por todo lado. Também há uma espécie de “Praça da Sé”, com pessoas vendendo bugigangas ou frutas e idosos sentados. Além disso, há as favelas, uma região de bares como a Vila Madalena e lojas como as da Rua Oscar Freire.
“A Colômbia é o país mais próximo do Brasil em termos de pessoas, as mulheres são muito bonitas, há mais negros que nos outros países, e a natureza é parecida, com florestas e bastante umidade”, compara Leonardo.
Segundo Rachel, Medellín é uma cidade limpa, bonita, e vale a pena visitar o Museu El Castillo, o Jardim Botânico e o Metrocable, um teleférico suspenso sobre uma favela.
Gastronomia
Além de manter um blog atualizado sobre a viagem, que se chama “Viajo logo existo” e inclui as estatísticas do percurso (dias de trajeto, países visitados, quilômetros rodados, dinheiro gasto e até as barras de cereal e pastas de dente consumidas), o casal criou um blog com dicas de gastronomia em cada lugar.
Entre os pratos típicos que eles recomendam, estão o cordeiro patagônico na Argentina; o “chivito” no Uruguai, um prato com carne, ovo e bacon; a “centolla” no Chile, que é um caranguejo gigante; o “lomo saltado” no Peru, um prato com carne e batatas; o camarão no Equador, que é um dos maiores produtores do mundo; e a “bandeja paisa” na Colômbia, que é nosso PF com arroz, feijão, banana frita, carne, ovo, toucinho e abacate, tudo “bem exagerado”.
Sobre os preços, os brasileiros revelam que, no Peru, um prato normal saía por US$ 3 por pessoa e o melhor restaurante com chef de cozinha renomado custava US$ 30 por pessoa.
“Em São Paulo, gastaríamos até R$ 400 por essa mesma refeição”, compara Leonardo, que junto com a mulher tem se mantido abaixo da meta de gastar US$ 100 por dia – hoje está em US$ 84, contando as despesas com combustível, comida, eventuais hospedagens, troca de pneu e manutenção do carro.
Fonte: G1