Bayard Boiteux

Nômade Digital: o lado que ninguém vai te contar

Tenho ouvido freqüentemente uma pergunta quase todos os dias: “como se faz para ser nômade digital? Eu queria tanto!” Depois que explico o processo, quase sempre, a mesma afirmação se segue: “que ‘inveja’! Mas eu não tenho essa coragem”.

Resolvi, então, discorrer um pouco sobre este tema, se me permitem. E o farei em 2 momentos: antes vamos falar do que ninguém fala: o lado ruim. No próximo post, falaremos do lado bom.
Antes de mais nada, vamos analisar o que leva alguém a escolher este caminho. Tudo se resume basicamente a uma breve explicação: busca pela liberdade. Liberdade de criação, liberdade de mobilidade, um desejo muito forte de viver outras culturas e não apenas ser um turista e, o mais importante, uma vocação inegável para viajar.
De fora, tudo é lindo: a pessoa “largou tudo” (nunca é exatamente isso), para ganhar a vida viajando, tirando fotos, filmando e escrevendo sobre lugares exóticos e paradisíacos.
Tudo bem, até existe alguma verdade nisso. Mas como dizem aqui na América do Norte, “no pain, no gain”. Existe igualmente um ônus que parece ser comum a quase todos os “digital nomads”. Os principais, que pude perceber ao logo desta jornada e compartilhando com outros digital nomads, são:

1) Você vai perder contato com quase todos os seus amigos

Você será “julgado” por ter conseguido voltar ao Brasil para o aniversário de casamento do Fulano mas não veio para o nascimento do filho da Beltrana que tanto te convidou. Além do mais, seus amigos ficarão no Brasil, no mesmo lugar geográfico, passando por experiências muito parecidas, normalmente, às que os pais e amigos deles tiveram e nutrindo as mesmas expectativas. Estarão envolvidos em sua cultura e sua comunidade como sempre estiveram. Lidarão com problemas que sempre lidaram. Você não.

Você decidiu sair pelo mundo, às vezes visitando países que nem a língua fala, conhecerá inúmeras culturas, visões de mundo diferentes, sociedades ultra civilizadas, outras nem tanto, algumas homofóbicas, outras poligâmicas, países onde cortar o clítoris das adolecentes é rito de passagem esperado inclusive por muitas delas própias, enfim… a cada novo destino, você não será mais a mesma pessoa. Algo de seu terá ficado no seu último destino e algo dele você levará com você. Tudo isso aliado ao fato de você não poder se ‘desenraizar” como bem explicou Suzan Weil, correndo o perigo de perder seu referencial identitário.

2) Você ficará muitas vezes bastante solitário

Ao “vagar” pelo mundo, irá conhecer todo os tipos de pessoas. Muitas vezes passará Natal, Ano Novo, seu aniversário na estrada, pois estará no meio de um projeto e não poderá simplesmente dizer aos seus sócios no Brasil: “ agora não vou publicar nada porque tenho que ir pra casa da minha māe“. Não dá. Mas o pior é que algumas pessoas que você conhecerá em seu caminho terão “pena” de sua solidão e lhe convidarão para passar essas datas com sus respectivas famílias, o que será pior, pois fará você lembrar das pessoas que ama e ficaram no Brasil. Sobretudo quando você estiver publicando para seu site ou seu blog em algum Starbucks longínquo e começar a tocar o SAMBA DO AVIĀO, como agora.


(Para quem nāo sabe, o Starbucks toca bossa nova em todas as suas lojas do planeta)

3) Sua família vai sentir [muito] a sua falta

Não adianta. Mãe é mãe. Avó é avó, tio é tio e por aí vai. Elas e eles vão querer saber sempre de você e quando ligar vão pedir para você voltar, para você se ‘estabilizar‘, ter uma vida “normal” e, por fim, algumas vão chorar.

Isto nos leva ao próximo tópico que é…

4) Você vai se sentir culpado

Não tem jeito. Após um certo tempo ouvindo ou, pior, vendo sua famíli ou sua amiga de infância, chorarem no Skype, no Facetime, no WhatsApp e no que mais inventarem, você vai se sentir culpado. E, por fim,

5) Tudo é vivido no dia de hoje e intensamente

Ser um Digital Nomad irá transformá-lo para sempre e profundamente, de uma forma que você se deparará com facetas de sua própria personalidade e de si mesmo que talvez ainda não conheça bem. A solidão da viagem e o lidar com culturas totalmente diferentes e com pessoas de todos os tipos possíveis, fará com que, no fim das contas, a aventura mais intensa, mais longa a muitas vezes mais interessante, não será nas praias de areias cor de rosa das Filipinas, nas barreiras de corais vermelhas e azuis da Austrália ou para o norte do planeta para testemunhar os fogos de artifício da Terra, chamados Aurora Boreal.
Nada disso. A melhor e mais intrigante viagem será para dentro de si mesmo, percorrendo vales, desertos e campos muitas vezes incrivelmente lindos, como você nunca havia imaginado que fossem e, outras vezes, enfrentando tempestades que você nem sabia que existiam.
Finalmente, com tudo isso, a idéia de voltar para casa estará constantemente pulsando no fundo da sua mente. Mas, ao mesmo tempo, uma pergunta irá sempre seguir esse pensamento:” mas… onde é “casa”? E aí, você perceberá que sua casa é ali onde você está: no café em Paris à beira do Sena, em uma praia no Caribe de mar azul turquesa ou na cama de um hotel 5 estrelas, porque ninguém é de ferro.
E aí ? Você está pronto para ser um nômade digital?


Fonte: MONDO BLU – Mochileiros Voluntários pelo Mundo – Alberto Escosteguy

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