O surgimento de manchas de petróleo no litoral do Nordeste levantou dúvidas sobre o que fazer com viagens marcadas para esses destinos. O G1 ouviu especialistas e órgãos de defesa do consumidor para responder às principais perguntas; veja abaixo.
Manchas de óleo do petróleo cru vistas na praia de Ipioca, no litoral norte de Maceió no último dia 13 de outubro — Foto: Pei Fon/RAW Image/Estadão Conteúdo
É possível cancelar um passeio ou pacote já
pagos sem pagar multa?
Segundo os órgãos de defesa do consumidor, o cliente que desistir de ir aos destinos atingidos pelas manchas de óleo pode negociar o cancelamento sem multa. Mas eles divergem quanto à obrigatoriedade das empresas em atender ao pedido.
O diretor-executivo da Fundação Procon-SP, Fernando Capez, afirma que não existe responsabilidade legal das empresas no caso do óleo, o chamado nexo causal. Isso porque elas não são causadoras do desastre.
“Reembolso total seria muito elogiável e correto por parte do fornecedor, mas ele não está obrigado a arcar com um prejuízo ao qual ele não deu causa”, diz Capez.
Mas ele alerta que, apesar de não existir culpa por parte das empresas, a relação delas com o cliente também se baseia em princípios como a boa fé e a vulnerabilidade do consumidor.
“Eu (dono da empresa) não dei causa, porém, são riscos naturais dos negócios que eu assumi. Então, essa empresa deve procurar o consumidor, negociar e verificar se ele tem interesse em reagendar. Ou na devolução do valor”, afirma Capez. “Tem que procurar, com o menor prejuízo possível, atenuar o sofrimento (do consumidor).”
Para Igor Marchetti, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), e Juliana Moya, da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), como as praias são um dos principais atrativos turísticos para a região, existe prejuízo para o cliente.
“O consumidor poderá cancelar os contratos e não deve ser obrigado a pagar multa por conta desse fato. É diferente de cancelar simplesmente por falta de interesse”, aponta Marchetti.
Juliana cita ainda o risco à saúde ou à segurança, no caso dos locais afetados pelo desastre, como fator que pode basear pedidos de cancelamento sem multa.
“Multa é punição. O consumidor não pode ser punido por algo que é alheio à vontade dele”, afirma Marchetti, do Idec.
Da mesma forma, diz o advogado, se a empresa quiser cancelar a viagem, pelo mesmo motivo de segurança, o consumidor não poderá exigir o contrário.
Capez, do Procon-SP, entende que deve ser analisado caso a caso. E a fundação se coloca à disposição para intermediar negociações de clientes que não tenham conseguido chegar a um acordo com as empresas.
E se o pacote não inclui cancelamento?
Algumas empresas ofertam hospedagem, por exemplo, com preços menores, mas sem a possibilidade de cancelamento.
A dica é ver o que o contrato diz, explica Marchetti, do Idec. “Se estiver escrito que não pode cancelar sob nenhuma circunstância, está claro. Mas, se não tiver menção a esse tipo de caso, não teria direito (de impedir o cancelamento por causa do desastre).”
Segundo o advogado, desistir da viagem por causa das manchas de óleo não é qualquer cancelamento. “Ele é fundamentado, igual (ao feito por) questões de saúde. Não é o que chamamos de cancelamento vazio”, afirma.
É possível remarcar a viagem?
A empresa não é obrigada a remarcar, dizem os órgãos de defesa do consumidor. Mas esta é uma possibilidade a ser negociada entre as partes.
Marchetti, do Idec, afirma que, no caso de existirem encargos operacionais (custos) para essa remarcação, eles podem ser transferidos para o consumidor.
E se for e não puder aproveitar a praia: pode pedir reembolso?
Juliana Moya, da Proteste, explica que o consumidor pode pedir para antecipar volta, mas tem menos chance de conseguir o dinheiro de volta. Mais seguro, segundo ela, é negociar, antecipadamente, o cancelamento ou a remarcação, de preferência para o mesmo destino.
No caso de passeio, existe a possibilidade de negociar a mudança do destino, para outra praia, por exemplo. “Procure informações que permitam que a viagem seja aproveitada do mesmo modo, fazendo outros passeios”, orienta Capez, do Procon-SP.
Caso o consumidor tenha tentado se informar com a agência ou o hotel sobre as condições do local e ouvido algo que não condiz com o que encontrou, ele deve fazer um relatório completo e detalhado (o nome de quem deu a informação, data e horário do contato, o que foi dito, etc), para transferir para a empresa o “ônus da prova”, diz o diretor do Procon-SP.
Como saber se uma praia foi atingida?
O site do Ibama publica balanços regulares das localidades atingidas. Para saber se uma praia está com manchas de óleo, é necessário checar se ela consta na lista mais atual (veja aqui) e qual a situação descrita no balanço.
O G1 também acompanha nesta reportagem a situação atual nas praias, segundo a lista do Ibama.
As localidades são divididas em 4 categorias:
- Oleada com manchas: a porcentagem da cobertura de óleo no local analisado varia de 11% a 50%;
- Oleada com vestígios/esparsos: a porcentagem da cobertura de óleo no local pode ser inferior a 1%, chegando a, no máximo, 10%;
- Não observado: localidades onde o óleo não era mais visível na última análise;
- Em limpeza: locais que estão em processo de limpeza, seja pelas autoridades, seja pela população.
Além de prestar atenção ao status das praias, é importante verificar a data da última análise do Ibama – informação que também consta nos balanços regulares publicados pelo órgão.
Isso porque praias registradas com status “não observado” podem voltar a sofrer com manchas de óleo por ação das marés. Foi o que ocorreu em Sergipe, onde todas as 17 praias apresentaram reincidência da substância após serem limpas.
Algumas das praias atingidas podem ser consideradas próprias para banho. Isto ocorre porque as manchas apareceram em forma de óleo quase sólido, ou seja, já com efeitos do clima, da luz e do sal. Assim, o óleo nem sempre afeta os relatórios de balneabilidade das autoridades estaduais.
Qual a previsão? O que acontecerá daqui para frente nas praias?
Especialistas ouvidos pelo G1 dizem que não é possível determinar a origem das manchas de óleo. Por isso, ainda não se pode afirmar o que deve acontecer daqui para frente.
Os órgão analisam imagens de satélites e ainda não identificaram o padrão de deslocamento do petróleo e suspeitam que ele esteja se deslocando abaixo da superfície, impedindo que projeções sejam feitas.
O Ibama e a Marinha, órgãos que estão atuando na investigação do desastre ambiental, não fazem projeções do que pode ocorrer nos próximos dias, mas o número de localidades atingidas se manteve estável na última atualização, feita nesta segunda (14), na comparação com o balanço do dia anterior.
Fonte: G1